sábado, 19 de março de 2011

Medo

Escutava barulhos estranhos. Ao caminhar na rua, sentia uma pressão diferente. Os sons não chegavam como de costume, havia ali uma tela, algo de novo. Incomodava-me certamente, mas tudo o que fiz foi tentar não perceber e seguir meu caminho. Apesar de todas as tentativas, eu senti medo.

Como uma água que escorre lenta e incansavelmente, lambendo cada ponto, sem esquecer-se de nenhum, o medo percorria meu corpo. Gotas serpenteavam seu caminho por todo meu eu, ignorando a força da gravidade e a força que fazia para contê-las. Meus pensamentos haviam sido inundados por completo.

A morte estava na esquina. Seu contorno era preto, preto demais. Certa sombra se imprimiu no dia, e de dia só restava lembrança. Não havia fumaça, não havia névoa, mas a sensação era de estar me afogando no ar. A cena era muito menos mítica do que pintam os tolos, simplesmente morte.

O medo açoitava-me sob a força de chuva. Estava encharcado, pesado. Não conseguia enxergar mais nada, visão turva, tempestuosa. Somente medo. Minhas mãos acertavam inutilmente o ar, buscavam algo para apoiarem-se. Nada havia ali, nada via ali.

Fitava meus pés, eles corriam. Não era capaz de escutar seus sons. A visão era algo estranho, via pouco e pouco era real. Realidade nunca foi um conceito dos mais fixos. Enfim vislumbrei uma rua que cheia de carros era ainda assim deserta. Na sinfonia de queimas, xingamentos e marchas; escutava muito e nada de ouvia.

E a morte me aguardava. Com a calma de que goza o próprio destino, apenas assistia. Poderia apostar que não se importava ou se divertia. Certamente era puro horror, não imaginação minha.

Tentava correr, mas o medo me dominava. A água era turbulenta, já estava além de meu quadril. Forçava as pernas sob a forma de desajeitados passos que não se concretizavam, perdendo-se no movimento da maré. Estava fixo como uma ilha em meio ao mar de medo.

Insensatez absurda, querer fugir de si próprio. Tempo travado ou rápido demais. Nada, nenhum e nunca. O medo me acometia como ondas, grandes paredes d’água impondo seu poder sob mim. Fui jogado segundo sua dança. Estava preso a assistir meu esforço inútil.

Foi então que desisti. Aceitei meu tão amedrontador fardo. Toda a água secou. A morte veio preta em minha direção, estava ensurdecedora. Chegou perto, cheirou-me. Eu estava petrificado em uma estátua suada de terror. Após alguns segundos lambeu-me, latiu e se foi. O medo se foi e eu fiquei a amaldiçoar, com todas as palavras que me ocorreram, aquele maldito vira-lata preto.

2 comentários:

  1. Crônica vencedora da categoria juvenil no concurso cultural ACESC 2010.

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  2. Daniii... não tenho nem palavras pra dizer alguma coisa!
    Vc é sensacional, e eu tenho certeza q se vc escrever livros, vc será muito consagrado!!! Que talento, que dom!
    Parabéns amigoo!!!!

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